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Petróleo na foz do Velho Chico: manifesto de povos e comunidades tradicionais

Composição de imagem EBPC (reprodução) e ranchada de marisqueiros na boca do Funil.

por Redação

O Fórum de Povos e Comunidades Tradicionais de Sergipe, em assembleia realizada no dia 31 de agosto, decidiu publicar carta aberta à sociedade brasileira exprimindo sua posição quanto à forma de condução do processo de licenciamento ambiental das atividades exploratórias da ExxonMobil na zona costeira da foz do rio São Francisco.


A movimentação do Fórum de Povos e Comunidades Tradicionais de Sergipe ( que se articula com comunidades, organizações e colaboradores dos diversos estados que serão afetados pelo empreendimento da ExxonMobil) através da campanha “No tempo da maré”, se dá em seguida à manutenção da Audiência Pública Virtual do processo de licenciamento (a cargo do IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais) para o próximo dia 14 (de setembro).

A Audiência Pública Virtual, como apresentado em matéria do InfoSãoFrancisco (27 de julho), foi objeto de ação do Ministério Público Federal, através de suas regionais em Alagoas e Sergipe, que publicou uma recomendação formal ao IBAMA, explicitando que o evento fosse suspenso de modo a que pudesse ser realizado, tão logo as condições sanitárias permitissem, de forma presencial. O órgão licenciador ignorou a recomendação.

No tempo da Maré

Em conversa (por telefone) com o InfoSãoFrancisco, Maísa Joventino dos Santos, da Articulação Popular São Francisco Vivo e atuante na campanha “No tempo da maré” explica mais sobre a mobilização das comunidades afetadas:

“Essa campanha e essa carta são fruto dessa intensa articulação. A campanha “No tempo da maré” faz parte de nossa estratégia política de levar a toda população a discussão sobre o empreendimento em questão, e se soma às diversas discussões, movimentos e lutas que discutem o modelo de desenvolvimento adotado no país, que coloca em vulnerabilização a vida e saúde de toda população.

Carlos E. Ribeiro Jr. / InfoSãoFrancisco
Marisqueiros beneficiando massunins em ranchada na boca do Funil, Pacatuba, SE.

Porém a distribuição dos prejuízos e riscos não é igualitária e atinge especialmente as comunidades tradicionais, que exigem o direito de serem consultadas e informadas antes que qualquer ação possa impactar seus territórios e que isso seja feito respeitando o seu tempo, o tempo da natureza, “o tempo da maré”.

Desconfiança, insegurança e comunicação falha

O documento produzido pelo Fórum deixa clara a grande desconfiança das populações quanto ao que é prometido pelo estudo produzido pela ExxoMobil para a foz do Velho Chico, quando comparado, pelo documento, a um currículo de desastres ambientais e as respostas aos mesmos adotados pela empresa.

Também são apontadas pela Carta Averta fragilidades na pesquisa que deu base ao EIA/RIMA, onde não constam metodologias que ouviriam as populações nos territórios de influência das atividades da ExxonMobil, ao mesmo tempo que não são observados procedimentos adequados de fornecimento de informações precisas, de fácil compreensão, a um significativo universo de populações em risco de possíveis impactos.

Outro problema que preocupa o Fórum é a crônica – e conhecida – dificuldade de acesso à internet pelas comunidades nas zonas de influência, uma realidade que é recorrente não só na zona da foz do rio São Francisco, mas em todo o seu trecho Baixo.

Na Carta Aberta, está bem definido que “os espaços virtuais, como reuniões remotas, não são espaços acessíveis às comunidades, que em sua maioria, quando temos acesso à internet, não dispomos de conexão de qualidade para acompanhar os diálogos, ou não temos facilidade com o uso destas plataformas.”

Ou ainda, como lembra Maísa, que “no lado alagoano da foz, por exemplo, temos uma comunidade quilombola que não tem acesso [internet] e energia elétrica, como poderão participar de Audiência Pública Virtual? “

Desrespeito

A aceleração do processo de licenciamento e a posição do IBAMA de manter a Audiência Pública Virtual da ExxonMobil criou uma situação de conflito o Ministério Público Federal, cujos próximos passos estão sendo aguardados não apenas pela pelas diversas comunidades afetadas mas também pela sociedade, uma vez que o comportamento do órgão pode apontar situações futuras desfavoráveis à proteção do patrimônio natural e dos seres humanos que dele dependem.

“O trâmite para licenciamento de um empreendimento de tamanha magnitude ser realizado em meio a uma pandemia é de profundo desrespeito à diversidade de contextos sanitários, econômicos e de acesso à informação, é violação de direitos”, acrescenta Maísa, que conclui:

“As comunidades têm direito de decidir sobre a exploração de substâncias tóxicas, comprovadamente cancerígena que é o petróleo, e que põe em risco seus modos de vida em equilíbrio com a natureza mantidos com saberes construídos há séculos.”

Leia/descarregue a Carta Aberta dos Povos e Comunidades Tradicionais à Sociedade Brasileira


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Fontes

Fórum de Povos e Comunidades Tradicionais de Sergipe