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Baixo São Francisco: publicado relatório final do quadro socioambiental

por Redação

A UFAL – Universidade Federal de Alagoas divulgou(13) o relatório final da 3ª. Expedição Científica do Baixo São Francisco que foi realizada no final de 2020: os dados apresentados não são animadores.


As Expedições Científicas no Baixo São Francisco, coordenadas pelo professor Emerson Soares, da UFAL – Universidade Federal de Alagoas, tiveram início em 2018 abrangendo a região entre o alto sertão (municípios de Canindé do São Francisco, SE e Piranhas, AL) e a foz do rio (municípios de Brejo Grande, SE e Piaçabuçu, AL).

O Relatório Final apresentado na última terça-feira não apresenta um Baixo São Francisco animador, pelo contrário. São inúmeras as evidências coletadas, processadas e analisadas que confirmam problemas graves em diversos aspectos não só dos ecossistemas aquáticos e terrestres (ripários e de transição), mas também quanto às condições de vida das populações humanas ribeirinhas.

Atendendo ao INFOSÃOFRANCISCO, o coordenador do programa de expedições científicas e professor da UFAL, Emerson Soares, explicou diversos aspectos sobre os estudos realizados em campo, algumas circunstâncias e os resultados das análises.

Sobre as vazões

“Nós trabalhamos, durante a expedição, com uma vazão [da UHE Xingó] que ficou em torno de 2.400 a 2.500 m³/s (metros cúbicos por segundo), porém mesmo assim os níveis de coliformes totais encontrados se encontram altos, apesar de uma pequena redução em relação aos anos de 2019 e 2018.”

Nota – a vazão citada pelo prof. Emerson Soares é referente a um padrão dito “de flexibilização”, pelos gestores, de um aumento, a partir de demanda do setor elétrico, das vazões bem mais reduzidas ao longo de 2020, o que vinha sendo praticado desde 2013. Em outubro de 2020 as vazões passaram à média de 2.000 m³/s (dois mil metros cúbicos por segundo), ainda abaixo dos 2.100 m³/s da vazão regularizada a partir da operação da UHE Sobradinho.

A cunha salina

“Houve uma diminuição da intrusão salina [coletas de dados no período da campanha], que ainda chega ao município de Piaçabuçu, ainda que mais abaixo, mas que afetou a diminuição da biodiversidade, pelo fato de que as espécies marinhas não adentraram pelo continente. Em comparação, tivemos mais espécies de água doce, que não foram observadas nos anos anteriores, o que é de grande relevância: a vazão [maior] é importantíssima para a região. Porém, mesmo com a vazão de 2.400/2.500 m³/s há a cunha salina.”

Com mais água, bom para os peixes

“Tivemos dificuldade na captura de peixes [em comparação às campanhas anteriores], pois com uma vazão maior, há mais volume, e os peixes se escondem dos apetrechos de pesca, fica mais difícil de capturar. Isso mostra a importância de que uma vazão mais alta serve de defeso ou proteção natural para as espécies de peixe.

É muito importante dizer que 90% dos peixes [capturados] estavam em processo de maturação sexual, ou seja, em processo reprodutivo. Tivemos cerca de 65% em 2018 e em 2019 na faixa de 80%. A vazão [maior] representa o gatilho para fins reprodutivos.”

Metais pesados e poluentes persistem nas coletas

“Quanto aos metais pesados, houve uma pequena reduzida com relação aos anos anteriores, mas chama a atenção que, na cidade de Piranhas, por exemplo, os níveis de contaminantes estão um pouco mais elevados. Piranhas é o primeiro município que recebe a carga da UHE Xingó, vinda de cima, e então os problemas genotóxicos com os peixes, contaminados, foram altos, principalmente as espécies carnívoras, em topo de cadeia, como o tucunaré (Cichla monoculus) [espécie exótica invasora], a pirambeba (Serrasalmus brandtii). É algo problemático pois pode trazer uma carga de contaminantes para as pessoas que consomem esses produtos.

Os poluentes estão mais elevados na cidade de Piaçabuçu, o que se deve à barreira geoquímica produzida pelas marés que faz com que haja menos diluição de nutrientes, que se acumulam, mesmo descendo, elevando os contaminantes.”

Um Baixo São Francisco, várias regiões

"É interessante que hoje pudemos caracterizar três regiões [ao longo do Baixo São Francisco]. A região Piranhas-Pão de Açúcar é diferente da região abaixo de Traipu e Igreja Nova, que é diferente da micro região de Penedo-Piaçabuçu, formando três regiões com características diferentes em termos ecossistêmicos. Tais diferenças podem ser decorrentes da morfologia do rio, influência de culturas na condição da água, maior ou menor densidade populacional, fatores que influem como impactos no ambiente. Há ainda, claro, a salinidade que afeta o trecho mais próximo da foz."

Leia/descarregue abaixo o Relatório Final da 3a. Expedição Científica do Baixo São Francisco

O assoreamento não para

“Constatamos a formação de mais ilhas e mais assoreamento. Fizemos também o trabalho de batimetria e topologia do fundo do rio, com SideScan [sistema de sonar de alta precisão porém ainda estamos finalizando as análises e serão necessárias mais varreduras, para aumentar a malha de pontos.”

O programa de monitoramento do Baixo São Francisco

De acordo com o apresentado no relatório, o programa surgiu com o pretexto de bioprospectar, conhecer e divulgar a situação do Baixo Rio São Francisco, quanto aos aspectos sociais das comunidades ribeirinhas, comunidade de pescadores, situação da pesca, identificar os impactos e a qualidade da água do rio, a ictiofauna, problemas ocasionados pelo represamento, assoreamento, desmatamento, avaliar os poluentes presentes no ambiente aquático e uso de agrotóxicos, e os efeitos da cunha salina sobre as comunidades ribeirinhas e o ambiente e propor ações mitigadoras através de programas de educação ambiental.

Com uma equipe multidisciplinar, para prover dados e informações sobre várias áreas do conhecimento, hoje o programa se consolida através da confirmação de assinatura de contrato de aporte de recursos, pelo CBHSF – Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, que permitirá a manutenção de atividades por mais cinco anos.

As expedições científicas propõem a elaboração de grande diagnóstico participativo e multidisciplinar sobre a situação econômica, social e ambiental da região do Baixo São Francisco.,

Através das campanhas são avaliados:

1- os impactos da pesca,

2- poluição aquática,

3- desmatamento e assoreamento,

4- patologias e parasitologia de peixes e crustáceos

5- índices de metais pesados e pesticidas e sua influência na qualidade do pescado,

6- o perfil socioeconômico e a situação da saúde das populações ribeirinhas,

7- medidas de educação ambiental efetivas,

8- qualificação do efeito das diversas culturas intensivas sobre a qualidade de água,

para com isso efetivar um programa de biomonitoramento ambiental da calha principal do rio São Francisco, utilizando de tecnologias de ponta para determinação de um padrão ambiental com intuito de propor ações mitigadores para os ecossistemas existentes na região de estudo.


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Fontes

UFAL - Universidade Federal de Alagoas - 3ª. Expedição Científica do Baixo São Francisco


Imagem em destaque: Reprodução