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Estado de Sergipe sem plano de emergência para o Baixo São Francisco

A enchente do rio Ipanema (2020). Foto: Defesa Civil/SE

por Carlos Eduardo Ribeiro Jr. | InfoSãoFrancisco

Defesa Civil de Sergipe diz que o estado não conta com plano preventivo integrado e ações emergenciais em caso de enchentes no Baixo São Francisco, argumentando que legislação atribui a competência aos municípios.


As situações de calamidade que hoje atingem a região sul da Bahia e o vale do Parnaíba, no Piauí, deixa evidentes a falta de preparo e de ações preventivas estruturais que o país tem para com situações que poderiam ser talvez menos destrutivas, com respostas mais rápidas e eficazes além de manter o alerta para com uma situação de insegurança no trecho Baixo do rio São Francisco a jusante da UHE Xingó.

Com nove barramentos de grande porte (incluindo Xingó mas sem contar as dezenas de PCHs – Pequenas Centrais Hidrelétricas em Minas Gerais e na Bahia) a montante de suas cabeças e com suas vidas diretamente afetadas pelas operações da UHE Sobradinho (1979/80), que regularizou as águas do Velho Chico, as populações ribeirinhas do Baixo São Francisco têm todas as razões para noites mal dormidas.

Na foz do rio Ipanema, AL, a visão da Ilha do Ouro, em Porto da Folha, SE, durante a enchente do rio Ipanema (2020). Foto: Defesa Civil/SE

Porém bem acordados, lembremos que a jusante de Sobradinho já foram registradas defluências da ordem de 13.696 m³/s (treze mil seiscentos e noventa e seis metros cúbicos por segundo) em 1979. Em 1992, mesmo com a definição da vazão de restrição máxima de 8.000 m³/s as defluências foram da ordem de 10.532 m³/s. O pico mais recente foi de 7.000 m³/s em 2007. Tais informações podem ser obtidas de forma mais simples em apresentação da CHESF – Companhia Hidro Elétrica do São Francisco de 2018.

Reprodução: CHESF

Muitas dúvidas

Assim, no despertar assustado, algumas perguntas que formam grande leque de dúvidas surgem na cabeça:

  • E se houvesse uma grande enchente, algo que é possível, uma vez que os barramentos não garantem o total controle das vazões em casos extremos?
  • Quais as consequências e como a União, estados e municípios da região agiriam, de forma coordenada, rápida, eficaz para poupar vidas humanas, além dos imensos danos materiais?
  • Qual seriam as áreas de fato alagadas, se a calha do São Francisco, totalmente assoreada, não comporta volumes de água similares a eventos anteriores à regularização (construção da UHE Sobradinho em 1979/80) e suas lagoas e várzeas marginais contam com grandes áreas ocupadas de forma irregular?
  • Qual seria o número de pessoas inseridas nas zonas de risco das áreas alagadas? Quais as estradas ou trechos das mesmas que seriam inviabilizados? Como seriam realizados resgates em locais isolados?
  • Como e onde seriam instaladas a totalidade das pessoas desabrigadas? Como seriam feitos os atendimentos de emergência? Haveria hospitais e equipes de profissionais disponíveis?
  • Como se daria o fornecimento de água potável, alimentos, medicamentos e atendimento aos atingidos? E o controle de doenças infecto-contagiosas, com a contaminação da água?
  • Foram realizados, em algum momento, campanhas esclarecedoras sobre uso e ocupação de zonas de risco, treinamentos periódicos para enfrentamento de um grande evento?
  • E os recursos para suportar tamanha operação, existem, estariam rapidamente alocados, quem paga a conta? Municípios pobres e sem recursos físicos, financeiros e humanos teriam condições de por conta própria enfrentar calamidade de grande porte?

Em busca de informações

Por falta de informações públicas precisas sobre tão pertinente e prioritário tema, em um planeta assolado pela crise climática que produz situações extremas e não tão previsíveis, o InfoSãoFrancisco encaminhou à SEDURBS – Secretaria de Estado do Desenvolvimento Urbano e Sustentabilidade ao estado de Sergipe, via sistema E-Ouv Sergipe (de acesso à informações públicas garantido pela LAI – Lei de Acesso à Informação) a seguinte demanda: “cópia de plano de emergência de atendimento à população no trecho baixo do rio São Francisco em caso de eventos extremos (cheiasdo rio São Francisco).”

Quem respondeu foi a Defesa Civil de Sergipe, onde argumenta (ver íntegra da resposta abaixo) que a Lei 12.608/2012 confere aos Municípios a responsabilidade de elaboração de seus Planos de Contingência de Proteção e Defesa Civil.

Reprodução: SE-Ouv/Sergipe

Mais dúvidas

A mesma Lei 12.608/2012 determina que cada estado deve elaborar seu Plano Estadual de Proteção e Defesa Civil, o que Sergipe produziu, sem que contenha previsão de prevenção/ação específica quanto à cheias no baixo São Francisco sergipano (identificados pelo estado como Alto Sertão Sergipano e Baixo São Francisco Sergipano) entre os municípios de Canindé do São Francisco, onde está a UHE Xingó e Brejo Grande, na foz do rio.

No capítulo relativo à bacia hidrográfica do São Francisco (no estado) não são encontrados mapas com lagoas e várzeas marginais da planície de inundação e zonas de alagamento (de acordo com grandes vazões possíveis) identificadas de forma precisa.

Reprodução: Defesa Civil/SE

A única representação do que seria uma área de risco está em um mapa onde uma linha paralela à margem do rio São Francisco (quando sabemos que a poligonal dos espelhos d’água relativo aos possíveis níveis de vazões extremas seria algo irregular, acompanhando o relevo da zona alagada) o que, como no outro mapa, não favorece o conhecimento dos possíveis cenários.

Reprodução: Defesa Civil/SE

A mesma solicitação endereçada ao governo de Sergipe foi encaminhada ao governo de Alagoas. Até o fechamento da matéria, não havia sido recebida resposta.


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Fontes: CHESF; Defesa Civil – Sergipe; Presidência da República; E-OUV/Sergipe


Sobre o autor

Carlos Eduardo Ribeiro Junior

Co-criador do InfoSãoFrancisco e coordenador do projeto.