por Carlos Eduardo Ribeiro Jr | InfoSãoFrancisco
Ignorando alertas de inúmeras entidades de cunho técnico, diretamente ligadas à gestão das águas no Brasil, Senado Federal sanciona indicações do Presidente Jair Bolsonaro para a diretoria da ANA – Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico criando um cenário futuro de incerteza e possível gestão temerária das águas doces brasileiras.
Recebendo mais uma leva de indicações do Presidente Jair Bolsonaro do estoque ainda disponível para cargos de diretoria de agências reguladoras, na quarta-feira da semana passada (06) o Senado Federal aprovou como nova Diretora-presidente da ANA – Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico Verônica Sánchez da Cruz Rios, ungida pelo Planalto conforme Mensagem ao Senado (a mensagem que trata da sua nomeação é a MSF 17/2022).
Na mesma ocasião foram sabatinados e aprovados pela CMA – Comissão de Meio Ambiente do Senado, presidida pelo Senador Jacques Wagner (PT-BA) para a diretoria da ANA , Ana Carolina Argolo Nascimento de Castro (MSF 20/2022), Mauricio Abijaodi Lopes de Vasconcellos (MSF 21/2022) e Filipe de Mello Sampaio Cunha (MSF 18/2022), enquanto que Ricardo Medeiros de Andrade foi indicado para o cargo de ouvidor-geral (MSF 14/2022).
As cinco indicações foram acatadas pela CMA sendo referendadas pelo plenário do Senado no mesmo dia.
Ocorre que o referendo às indicações do Presidente Bolsonaro pelo Senado Federal para a diretoria da ANA não ocorreu livre de alertas e críticas, sobretudo da parte de entidades diretamente relacionadas à gestão de recursos hídricos, como a ABAS – Associação Brasileira de Águas Subterrâneas e a ASÁGUAS – Associação dos Servidores da Agência Nacional de Águas.
Em 2 de dezembro de 2021, a ABAS encaminhou ofício para o Presidente do Senado Federal, Senador Rodrigo Pacheco, onde alertava que “a indicação para recomposição da Diretoria da ANA em 2022, deve priorizar o perfil técnico dos indicados, relacionado às áreas de Gestão de Recursos Hídricos, Águas Subterrâneas, Segurança de Barragens e Saneamento Básico, de modo a assegurar condições para a continuidade da excelência da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico no desempenho de suas missões institucionais”.
Em 11 de janeiro passado, a ASÁGUAS, por sua vez, envia ofício (Of. no 01/2022/ASÁGUAS 9 – Assunto: Indicação para cargos de diretores da ANA – Aspectos Legais ) ao Senador Jaques Wagner (PT-BA) Presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado Federal, onde considerava que “A análise individual dos currículos dos profissionais indicados pelo Presidente da República, com base nas informações disponíveis na internet, permite inferir que esses nomes não atendem aos requisitos mínimos estabelecidos na Lei nº 9.986/2000, notadamente pela falta de experiência e notoriedade na gestão ou regulação de recursos hídricos e de saneamento básico e pela falta de formação acadêmica compatível com o cargo de diretor da ANA, seja por meio de graduação ou pós-graduação.”
Reforçando sua preocupação com o funcionamento da agencia, a ASÁGUAS cita ainda que “o não atendimento a esses requisitos por parte dos indicados fragiliza a atuação da Diretoria Colegiada da ANA como um todo, com impactos relevantes no Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH) e na atuação regulatória do saneamento básico.” e que os servidores da ANA “esperam que as premissas ditadas em Lei, bem como estabelecidas no caput do art. 37 de nossa Constituição Federal, sejam sempre observadas e respeitadas, em prol da atuação com eficiência e eficácia desta Agência Reguladora e a consequente contribuição para melhoria da vida dos brasileiros.”
Mais adiante, no dia 5 de abril, a ASÁGUAS encaminha nova manifestação ao mesmo Senador Jacques Wagner ( Of. no 05/2022/ASÁGUAS 9 -Assunto: Indicação para cargos de diretores da ANA – Aspectos Legais – Requisitos mínimos ) expressando “muita preocupação as indicações do Presidente da República para a Diretoria Colegiada da ANA, mais especificamente aquelas que não atendem aos requisitos mínimos definidos pela Lei nº 13.848/2019.”
O coletivo dos servidores da ANA fundamentavam a inconsistência na indicação de Verônica Sánchez da Cruz Rios na análise de seu Curriculum Vitae onde “ nenhum dos requisitos das alíneas “a”, “b” e “c” do inciso I e, cumulativamente, o inciso II, estabelecidos no art. 42 da Lei nº 13.848/2019, que alterou o art. 5º da Lei nº 9986/2000, e isto caracteriza, de forma objetiva, o não cumprimento da Lei Geral das Agências Reguladoras no processo de indicação de nomes para ocupação de cargo de Diretores da ANA. Em suma, o perfil profissional e experiência da indicada não cumprem os requisitos mínimos da Lei.”
Critica semelhante foi tecida quanto à indicação de Filipe de Mello Sampaio Cunha para o cargo de diretor da agência.
A ASÁGUAS finaliza seu ofício ressaltando que “em hipótese de aprovação dos indicados, a totalidade da diretoria da ANA será composta por profissionais que não possuem formação ou experiência nas áreas finalísticas da agência, comprometendo a execução das políticas de recursos hídricos, de saneamento básico e de segurança de barragens (grifo nosso).”
O resultado das sabatinas, consideradas um sucesso pela CMA, e as votações no Senado indicam que tanto aquela como a casa não atribuíram a devida relevância aos alertas encaminhados pela ABAS e pela ASÁGUAS.
A Senadora Kátia Abreu (PP-TO), relatora da análise da mensagem de Jair Bolsonaro indicando Verónica Sánchez, não produziu em seu documento uma única linha específica com precisas considerações relacionadas a eventuais experiências da candidata no campo da gestão de águas.
Sem maiores hesitações, com 51 votos a favor, 3 contrários e uma abstenção (não são conhecidos os votos abertos dos senadores, que utilizam a votação secreta), o Plenário do Senado aprovou a condução de Verônica Sánchez da Cruz Rios para o cargo de Diretora-presidente da ANA.
Por sua vez, Ana Carolina Argolo Nascimento de Castro obteve no Plenário Senado 39 votos a favor, 14 contrários e uma abstenção, em seguida à aprovação de seu nome na CMA, onde recebeu parecer favorável do senador Eduardo Gomes (PL-TO).
Segundo a Agência Senado, durante a reunião da CMA, o senador Confúcio Moura (MDB-RO) confirmou a recepção de manifestações de sindicatos e associações com críticas às indicações para a chefia da ANA.
O presidente da CMA, Senador Jaques Wagner confirmou também ter recebido os questionamentos, e alegou que não caberia a ele fazer essa avaliação, “inclusive porque os denunciantes não esclareceram quais seriam as dúvidas…[uma vez que] a responsabilidade da análise caberia ao relator de cada indicação, bem como aos membros da comissão.”
Disse ainda o presidente da CMA que “a metodologia com que estamos trabalhando é comprometedora. As indicações, independentemente de estarem há mais tempo no Diário Oficial, chegaram a esta comissão anteontem [segunda-feira], às 10 horas da noite. Então o relator tem uma responsabilidade; tem que apreciar, estudar, olhar para os ditames legais das indicações, até porque todo mundo que vai para agência tem mandato (grifo nosso)”.
Fontes: Senado Federal; Agência Senado; Correio Braziliense; ASÁGUAS; ABAS
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