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“Variações de vazão da Resolução ANA – 2081/2017, foram previstas e respaldadas pelo IBAMA”, diz órgão

 

Sem apresentação de documentos que atestem a inexistência de impactos causados pelas drásticas redução e variações das vazões no Baixo São Francisco, IBAMA transfere “controle ambiental” para a CHESF, à qual cabe a mitigação de “possíveis impactos ambientais”.

 

 

Ainda que com o padrão 2021 (já na segunda versão) do rio São Francisco a jusante das UHE Sobradinho e UHE Xingó com a imposição dos modelos operacionais estabelecidos pela Resolução ANA 2081/2017 mostrando os esperados efeitos negativos (que se soma ao passivo da regularização e demais interferências desde 1979/80), o IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis considera o quadro ambiental no Baixo São Francisco dentro da normalidade. Danos ambientais provocados pelas barragens são classificados apenas como uma distante possibilidade, sem vínculos com o avanço e consolidação do domínio da água do Velho Chico pelo setor elétrico através de um sistema que “normaliza” e regulariza, legalmente, um dos modelos mais predatórios de operações de barramentos.

A posição do IBAMA é o resultado de solicitação ao órgão com o objetivo de obter documentação comprobatória, para a emissão de autorizações, da inexistência de impactos ambientais com vazões inferiores a 1.300 m³/s (hum mil e trezentos metros cúbicos por segundo).

A demanda, realizada através de manifestação pelo sistema Fala BR (antigo E-Sic) sob o número 02303.000213/2021-95 é simples:

Considerando as operações da UHE Xingó sob o padrão estipulado pela Resolução ANA-2081/2017, com vazões abaixo de 1.300 m³/s determinadas pelo Plano de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, solicitamos:

1- Autorização do IBAMA em vigor que permite operação abaixo de 1.300 m³/s.

2- EIA/RIMA para operações de Xingó sob o regime de variações de vazões apresentado na Resolução ANA -2081/2017.

Sem apresentar documentos que comprovem, detalhadamente, que não há impactos com as operações de barramentos nos padrões mencionados, a Diretoria de Licenciamento Ambiental (DILIC), de forma vaga, encaminhou resposta que mostra, lamentavelmente, o distanciamento do órgão de suas atribuições primeiras: a proteção do patrimônio natural brasileiro.

Para a pergunta no. 1 o IBAMA manifesta que  “ Embora a Autorização Especial nº 12/2017 tenha sua validade expirada por comandos internos previstos na própria autorização, seus controles ambientais foram determinados à CHESF para mitigar os possíveis impactos ambientais decorrentes da redução de vazão”.

Deve ser observado que, estando a Autorização Especial 012/2017 vencida, a UHE Xingó opera apenas com a LO – Licença de Operação 147/2001 – 2ª. Retificação – 2ª. Renovação (2016), onde o item 2.19 deixa clara a condicionante:

Manter, salvo em condições hidrológicas extremas e com a devida autorização do IBAMA, vazão defluente mínima ininterrupta de 1.300 m³/s até a realização de estudos que subsidiarão a definição de vazão remanescente, com base em critérios ambientais.

Veja/descarregue a LO – Licença de Operação 147/2001 – 2ª. Retificação – 2ª. Renovação (2016)

Quanto ao segundo questionamento, diz a DILIC que “estudos prévios são exigidos de empreendedores para subsidiar tomadas de decisão quanto à viabilidade ambiental da implantação de novos projetos, o que não é o caso das variações de vazão apresentadas na Resolução ANA – 2081/2017, foram previstas e respaldadas pelo Ibama, com base no grande volume de informações existente nos processos de licenciamentos ambientais das usinas hidrelétricas do rio São Francisco, inclusive já utilizados para a tomada de decisão de expedição das Autorizações Especiais anteriormente expedidas”.

Alguns pontos a considerar: o padrão das operações da UHE Xingó no presente segue modelo completamente diferente daquele inicialmente desenhado quando de sua implantação. Quando do início das reduções de vazão 2013, foram emitidas Autorizações Especiais, sem documentação comprobatória de ausência de impactos, para uma situação que era considerada excepcional.

E, ainda, “o grande volume de informações existentes”, segundo o IBAMA, nunca foi apresentado na forma de material que referendasse a ausência dos impactos das operações. É informação de interesse público, nacional.

Através da Resolução ANA 2081/2017 foi imposta a normalidade de uma vazão mínima legalizada de 700 m³/s para um Velho Chico com desenho aprimorado pelo setor elétrico, onde os impactos são apenas “possíveis”, segundo o IBAMA, ou “eventuais”, segundo a ANA – Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico.

Deve ser mencionado, ainda, que o IBAMA estabeleceu, para um tema do mais transparente interesse público, uma curiosa classificação à manifestação: “Este pedido de informação ou sua respectiva reposta contém informações sujeitas à restrição de acesso conforme previsto na Lei n°12.527/2011 (Informação pessoal ou sigilosa)”.

A classificação do tema apenas se adiciona à notória e desalentadora atuação do órgão quanto à proteção do patrimônio natural brasileiro de nome rio São Francisco.

Veja o vídeo com animação do hidrograma das operações da UHE Xingó nos últimos sete dias:

 

Indo um pouco mais além, vale ainda a comparação dos hidrogramas da UHE Xingó e os das estações de Itacoatiara, e Cruzeiro do Sul, respectivamente no libertos rios Solimões/Amazonas e Juruá, no mesmo período (22/01 a 29/01). 

O quadro socioambiental do presente Baixo São Francisco é a resposta óbvia quanto às diferenças entre um rio livre e um barrado onde é produzida energia “verde, limpa, sustentável”.

A nação tem o direito inequívoco de conhecer, da parte dos entes da gestão do São Francisco, a comprovação de que um rio com tal perfil de “pulsos” horários, ao longo do dia, das semanas, de meses e anos de regularização, pode ser compatível com um meio ambiente que permita vida adequada não só para os ecossistemas aquáticos e dos terrestres que dele dependem, mas também das milhares de pessoas das populações ribeirinhas difusas, hoje com conhecidos e graves problemas de acesso à água em quantidade ou qualidade compatíveis para o consumo humano.

O espaço neste sítio está disponível para esclarecimentos por parte de órgãos e entidades citados.


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ACP das Algas – determinada realização de perícia no Baixo São Francisco 


Fontes

CHESF – Companhia Hidro Elétrica do São Francisco

ANA – Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico


Imagem em destaque – Leito do rio exposto com vazões reduzidas, apresentando ainda a vegetação de transição invasora. Foto: Carlos E. Ribeiro Jr. | InfoSãoFrancisco

Sobre o autor

Carlos Eduardo Ribeiro Junior

Co-criador do InfoSãoFrancisco e coordenador do projeto.