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UHE Xingó: CHESF reduz fortemente vazão sem aviso prévio

Carlos Eduardo Ribeiro Junior

OPERAÇÕES DE BARRAMENTOS | VAZÕES UHE XINGÓ
REDAÇÃO INFOSÃOFRANCISCO

Setor elétrico mantém a imposição de padrão insuportável para o rio e populações ribeirinhas, operando Xingó com vazão reduzida de forma drástica neste final de semana(sábado, 7 e domingo, 8), sem o necessário e devido preparo

 

Após anunciar o aumento das vazões defluentes da UHE Xingó para cerca de 2.900 m³/s (dois mil e novecentos metros cúbicos por segundo para o próximo dia 11 – já com pouca margem para adequação de sistemas de captação), sem comunicado prévio e preparatório, a CHESF – Companhia Hidro Elétrica do São Francisco, reduziu de forma considerável as vazões da UHE Xingó neste final de semana.

A redução do nível do espelho d’água foi da ordem de mais de 1.000 mm criando uma série de situações que não favorecem o caminho de solução para os conflitos crescentes com o setor elétrico 

A região fisiográfica do Baixo São Francisco afetada pelas operações de Xingó. Cartografia InfoSãoFrancisco

( como já apresentamos diversas vezes, na região do alto sertão e parte do Baixo São Francisco a jusante, para cada 100 m³/s temos uma variação da ordem de 190/200 mm no nível do espelho d’água).

A situação, na Reserva Mato da Onça, na tarde de domingo (08/11). Foto: Carlos E. Ribeiro Jr | InfoSãoFrancisco
A pequena bomba para captação de água para uso humano completamente em seco. Foto: Carlos E. Ribeiro Jr. | InfoSãoFrancisco

Populações difusas submetidas a problemas de captação

Qualquer variação causa problemas, sobretudo pela situação de imprevisibilidade, ao contrário de marés naturais, totalmente previsíveis com longa margem, como temos na foz do São Francisco. A faixa da variação ocorrida cria situações difíceis, pois a partir da anunciada elevação(e manutenção) das vazões em 2.500 m³/s, são feitos ajustes em sistemas de captação.

Tubulações e linhas elétricas, por razões de segurança dos equipamentos (bombas em flutuantes), foram recuadas – seguindo a modificação do espelho d’água – em direção da linha marginal para não ficarem expostas ao mar formado, ventos, destroços flutuantes.

Há ainda a questão da eficiência e custos de operação das captações, pois com a as reduções da vazão, os sistemas chegaram a limites técnicos que determinam dimensão (diâmetro) dos cabos elétricos, por exemplo, além da potência de bombas que também é influenciada pela altura a ser vencida pela água. São pontos que significam custos não insignificantes para a grande maioria da população difusa que depende diretamente de pequenos sistemas para sua sobrevivência.

Na Reserva Mato da Onça, a bomba impossibilitada de operar. Foto: Carlos E. Ribeiro Jr. | InfoSãoFrancisco

Qualidade da água

Com a redução da defluência de Xingó, muitas bombas se encontraram literalmente no meio da lama, onde a água é de péssima qualidade. Durante o sábado e o domingo foi impossível a captação de água para consumo humano.

Com possibilidade de danos maiores, a bomba e seu flutuante encalhados sobre a estrutura de fixação e vegetação invasora no leito do rio. Foto: Carlos E. Ribeiro Jr. | InfoSãoFrancisco
Com a válvula da bomba em meio à lama, não há qualquer possibilidade de uso da água. Foto: Carlos E. Ribeiro Jr. | InfoSãoFrancisco

Navegação

Naturalmente, uma variação de hum metro atinge a mobilidade coletiva, ao serem criadas restrições à navegação em diversos pontos, portos, etc. Sem o aviso da redução, no caso particular da Reserva Mato da Onça, hoje com acesso único por água – a estrada de acesso está comprometida sem que o município realize os trabalhos de adequação há vários anos, apesar de inúmeras solicitações formalizadas, ocorreu uma situação de supressão/dificuldade de mobilidade, posto que as duas lanchas de serviço amanheceram em terra.

Usos múltiplos, silêncio da gestão e do licenciador

O Baixo São Francisco, além de ser diretamente (e há mais de quarenta anos) impactado pela regularização do rio com a construção da UHE Sobradinho (veja Sobradinho +40 – A desintegração do rio da integração), é submetido às variações de defluência da UHE Xingó ao longo do dia, o que mostra o completo domínio do setor elétrico sobre as águas do Velho Chico. É uma situação que não atende aos usos múltiplos das águas, onde o uso humano é prioritário, afetado pela disponibilidade precária e qualidade do precioso líquido.

Os órgãos/entes do sistema de gestão, como ANA – Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico e o Comitê da Bacia permanecem silenciosos, assim como estados de Sergipe e Alagoas (e todos os municípios do Baixo afetados pelas operações, lembrando que Aracaju depende de cerca de 60% das águas do São Francisco para seu abastecimento) assim como o IBAMA – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, que não estabelece, no escopo de sua função precípua de defesa de nosso patrimônio natural, um valor rígido para as variações das chamadas “vazões médias”.

Com a inaceitável validade da Autorização Especial 012/2017 que permite à CHESF a vazão mínima de 550 m³/s, o ONS – Operador Nacional do Sistema está confortavelmente instalado para determinar a operação dos barramentos sem qualquer critério ambiental ou de respeito ao uso humano.

Sem acesso instantâneo aos dados de vazões da UHE Xingó

A questão das operações de Xingó, com variações horárias ao longo do dia é um problema antigo que se agrava com a

Tabela disponível no site da CHESF em 09/11/2020 até 10:46. Reprodução CHESF

manutenção de um sistema que não possibilita o acesso aos dados que indiquem as vazões defluentes (instantâneas, a qualquer momento, disponíveis vinte e quatro horas, finais de semana e feriados) em práticas no barramento.

O acesso às leituras das vazões em operação pela UHE Xingó transcende a vinculação à Lei de Acesso à Informação, por ser informação diretamente relacionada à práticas que interferem (diariamente, ao longo das horas) no cotidiano de milhares de pessoas e em na segurança coletiva das populações ribeirinhas no Baixo São Francisco.

Deve ser citado que às 07:46 de hoje, no site da CHESF, as informações sobre as vazões horárias da UHE Xingó (já realizadas) constavam tão somente até o dia 03 de novembro.

Autorização de vazão mínima de 550 m³/s em vigor

Sob o silêncio de todos os entes da gestão, municípios, estados e da sociedade do Baixo São Francisco, Xingó segue operando com a Autorização Especial 012/2017 que permite a vazão mínima de 550 m³/s..

A manutenção ad eternum da autorização, quando a ANA define e estação como normal, é um precedente extremamente danoso para com o já precário processo de licenciamento de operações de barramentos, colocando em risco, pela temerária situação, não apenas o São Francisco, mas todos os demais rios brasileiros que tenham barramentos em suas bacias.

 

ATÉ QUE CAIA

Em 13 de dezembro de 2019 foi publicada a matéria 550 m³/s! Vazão mínima autorizada [ainda] em vigor no Baixo São Francisco. Desde aquela data não são conhecidas, até o momento, disposições e/ou ações que levem ao cancelamento da Autorização Especial IBAMA 012/2017 e necessárias responsabilizações.

Temos, então, que a UHE Xingó permanece operando com a acima citada Autorização Especial 012/2017, sem qualquer reação, inclusive por parte dos entes do sistema de gestão que, naturalmente, não são desconhecedores da situação.

Os efeitos danosos se acumulam ao passivo já considerável de exatos quarenta anos de regularização desde a entrada em operação de Sobradinho (1979/80).

Para que esse caso não caia no esquecimento, na normalidade cotidiana, será mantida a republicação desta denúncia agregada à cada nova notícia, ininterruptamente, até que seja conhecida reação que conduza ao cancelamento/revogação desta licença que equivale a mais um desastroso passo rumo ao fim do rio São Francisco.

Veja ainda

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550 m³/s! Vazão mínima autorizada [ainda] em vigor no Baixo São Francisco

Fontes

CHESF – Companhia Hidro Elétrica do São Francisco

 

Imagem em destaque – Reserva Mato da Onça. Foto: Carlos E. Ribeiro Jr. | InfoSãoFrancisco