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Vazão ainda menor aos finais de semana: algas e plantas para consumo humano

Com a operação sob vazões moduladas, o setor elétrico mantém a imposição da quantidade e qualidade de água que entende serem adequadas para as populações ao longo do Baixo São Francisco: demais entes do sistema de gestão, municípios, estados e órgãos ambientais e vinculados à saúde permanecem em silêncio.

Enquanto o Reservatório Equivalente (a soma de todos os volumes úteis nos reservatórios da bacia do São Francisco) permanece bem abastecido ( 87,03%), estando Sobradinho com 93,29% e Itaparica com 53%, não bastando a celebrada e insuficiente vazão de 1.100 m³/s ao longo da semana, nos finais de semana, as médias são menores levando a situação nas bordas do espelho d’água a extremos.

Situação de reservatórios na bacia em 24/05/2020. Fonte: ANA

Deve ser mencionado que a partir das observações diárias e das insuficientes e pretéritas informações (da ANA e CHESF) das vazões praticadas pela UHE Xingó, verificam-se discrepâncias nos dados publicados. Por tal razão é necessária a urgente e imediata ativação da estação Xingó Barramento no quesito DEFLUÊNCIAS INSTANTÂNEAS, uma vez que, em todo o Baixo São Francisco apenas a estação Propriá fornece tais dados.

Área em limpeza na Reserva Mato da Onça. Nível do espelho d’água em 24/05/2020. Observar o nível da água e a faixa de material orgânico exposta em seco, abaixo da zona invadida pela vegetação terrestre (sobre o leito do rio). Foto: Carlos E. Ribeiro Junior | Canoa de Tolda/InfoSãoFrancisco

Situação extrema que obriga – se as pessoas desejam um mínimo de limpeza ambiental em suas beiras de rio – um acréscimo do insuportável trabalho (desenvolvido durante a semana) de remoção do material orgânico em decomposição. Material pesado que deveria, seguindo protocolos de limpeza ambiental adequados, ser extraído para fora da água. Pela quantidade e peso da massa orgânica (algas e vegetação aquática compactadas e em decomposição) é inviável tal procedimento.

Bomba de captação de água para uso humano, limpa há seis dias, novamente invadida por algas verdes. Foto: Carlos E. Ribeiro Jr. | Canoa de Tolda/InfoSãoFrancisco

O material mais superficial é colhido manualmente (os fragmentos e camadas flutuantes ou semi-flutuantes), espremido, para baixar o peso, embarcado em caixas flutuantes e levado, a nado, para ponto onde haja correnteza que disperse o mesmo. Em seguida é feita raspagem e arrastamento do material depositado sobre o leito do rio para enchimento das caixas e despejo como mencionado.

Essa atividade não é conclusiva, deve ser repetida várias vezes ao mês, sem parar, uma vez que é evidente o desequilíbrio dos ecossistemas aquáticos com a expansão desenfreada dos mais diversos organismos animais e vegetais, nativos ou exóticos invasores.

A propagada e oficializada “significativa melhoria” da qualidade da água – infestada de algas – promovida pelos entes do sistema de gestão do São Francisco, lamentavelmente, não condiz com a realidade e tende a quadros piores nas próximas semanas.

O material é raspado do fundo, ou coletado na água (em suspensão, ou flutuante), espremido para secagem e diminuição do peso, acondicionado na caixa. Foto: Daia Fausto | Canoa de Tolda/InfoSãoFrancisco

Deve se ainda registrado que o cada vez mais espesso manto de matéria orgânica em decomposição não ocorre apenas nas zonas próximas às bordas do espelho d’água. Há verificação do problema de forma generalizada no leito do rio, quadro que exige ações urgentes e imediatas: mesmo com a proximidade do inverno, e com temperaturas da água mais amenas, já está em processo uma nova expansão das massas de algas verdes (bem alimentadas pelo farto material orgânico das gerações anteriores tanto de algas como de vegetação) que tenderão a uma quadro consideravelmente pior nos meses do verão.

As situações registradas não são casos pontuais. Temos uma generalização do avanço de macrófitas invasoras exóticas variadas, de algas verdes e outros organismos (como os mexilhões dourados) por todo o Baixo São Francisco sendo que o comprometimento na região da foz é ainda mais grave: o estuário e barras do sul contam com a consolidação da intrusão salina (com a vazão da ordem de 50% da vazão estabelecida desde a construção de Sobradinho) e a linha da zona costeira recua continuamente, com a dramática segmentação do canal da Parapuca.

A nado, a caixa é levada para o extremo do cascalho (que deveria estar completamente submerso e não coberto por vegetação terrestre invasora) onde ainda há correnteza. Foto: Daia Fausto | Canoa de Tolda/InfoSãoFrancisco
No local onde as águas correm, o material é despejado, a contragosto e por incapacidade física, pela enorme quantidade custo (custo imposto aos atingidos pelas operações). Foto: Daia Fausto | Canoa de Tolda/InfoSãoFrancisco

ATÉ QUE CAIA

Em 13 de dezembro de 2019 foi publicada a matéria 550 m³/s! Vazão mínima autorizada [ainda] em vigor no Baixo São Francisco. Desde aquela data não são conhecidas, até o momento, disposições e/ou ações que levem ao cancelamento da Autorização Especial IBAMA 012/2017 e necessárias responsabilizações.

Os efeitos danosos se acumulam ao passivo já considerável de exatos quarenta anos de regularização desde a entrada em operação de Sobradinho (1979/80).

Para que esse caso não caia no esquecimento, na normalidade cotidiana, insistiremos nesse tema, ininterruptamente, até que seja conhecida reação que conduza ao cancelamento/revogação desta licença que equivale a mais um desastroso passo rumo ao fim do rio São Francisco.


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◊ Imagem em destaque – Algas e plantas para consumo humano | Foto: Carlos E. Ribeiro Jr. | Canoa de Tolda/InfoSãoFrancisco

Sobre o autor

Carlos Eduardo Ribeiro Junior

Co-criador do InfoSãoFrancisco e coordenador do projeto.