A redução para 1.100 m³/s, com Sobradinho chegando a 100% de seu volume é mais um capítulo do desastre da gestão do São Francisco controlada pelo setor elétrico sob a complacência do demais entes do sistema
Nesta sexta feira, após o comunicado da CHESF de 05 de maio, a vazão no trecho baixo do São Francisco ( até então no patamar de 1.300 m³/s, a pedido do governo de Sergipe, extremamente preocupado com o abastecimento além margens – Aracaju, principalmente) teve início o processo de redução da defluência da UHE Xingó para o valor de 1.200 m³/s.
A partir da consideração da “significativa melhoria da qualidade” estabelecida pelos formuladores do rio São Francisco oficial, a realidade para as populações do Baixo São Francisco se embrutece.
Estando o reservatório de Sobradinho próximo de completar o volume total de armazenamento de água, temos um furioso e hediondo sistema de operações (vazões moduladas com variações diárias inconcebíveis para a manutenção da vida dentro e contígua à água; a edição da resolução 2081/2017, por parte da ANA – Agência Nacional de Águas, que detona o Plano de Bacia e impõe uma vazão mínima legal de 700 m³/s, abaixo dos 1.300 m³/s estabelecidos; uma autorização especial do IBAMA, a 012/2017 que é prorrogada ad eternum permitindo a vazão mínima de 550 m³/s) que, suicida, certamente não hesitará em se apossar da derradeira gota de água do rio São Francisco.
Temos a considerar os quarenta anos de regularização, desde a regularização pela operação da UHE Sobradinho, com seu passivo socioambiental incalculável, e as sobreposições dos passivos produzidos pelas reduções de vazão em 2001/2, 2003/4, 2007/8 e 2013 ao presente numa região que enfrenta gravíssimos problemas de acesso à água de qualidade, sem acesso universal à água potável, sem sistemas de coleta e tratamento de esgotos. Em meio a uma das mais terríveis crises sanitárias da história recente do mundo, a Covid-19, mais do que nunca seria necessária maior, muito maior quantidade de água que garantisse à população ribeirinha, em particular aquela difusa, que não é beneficiada por sistemas de captação e tratamento de água, melhores condições.
No entanto o que é praticado segue procedimentos cada vez mais impositivos da posse da água pelo setor elétrico sob completa aquiescência dos órgãos ( ambientais, de saúde) de estados, municípios, cabendo ao IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, cuja missão seria a proteção de nosso patrimônio natural, o papel miúdo de emissão das consecutivas autorizações especiais para as reduções das vazões regularizadas.
Nesse universo de omissões, também há que se lamentar o silêncio passivo das sociedades local e do país, ao assistirem sem qualquer reação os procedimentos que levarão, sem dúvida, o São Francisco ao seu final – o fim do canal da Parapuca, derradeira veia do rio a irrigar as barras do sul em seu estuário é a prova incontestável do futuro preparado pela chamada gestão – , situação que segue a regra aplicada pelo país para a grande maioria dos rios brasileiros.
Sobradinho vai enchendo, mas, é apenas um detalhe.
Para riba, água, para o Baixo, algas.
ATÉ QUE CAIA
Em 13 de dezembro de 2019 foi publicada a matéria 550 m³/s! Vazão mínima autorizada [ainda] em vigor no Baixo São Francisco. Desde aquela data não são conhecidas, até o momento, disposições e/ou ações que levem ao cancelamento da Autorização Especial IBAMA 012/2017 e necessárias responsabilizações.
Os efeitos danosos se acumulam ao passivo já considerável de exatos quarenta anos de regularização desde a entrada em operação de Sobradinho (1979/80).
Para que esse caso não caia no esquecimento, na normalidade cotidiana, insistiremos nesse tema, ininterruptamente, até que seja conhecida reação que conduza ao cancelamento/revogação desta licença que equivale a mais um desastroso passo rumo ao fim do rio São Francisco.
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Fontes
ANA – Agência Nacional de Águas
CHESF – Companhia Hidro Elétrica do São Francisco
ONS – Operador Nacional do Sistema
◊ Imagem em destaque – A água que cabe ao Baixo no aquafúndio | Foto: Carlos E. Ribeiro Jr. | Canoa de Tolda/InfoSãoFrancisco